Durante a 30ª Bienal de São Paulo – A Iminência das Poéticas , que passou pelo b_arco em 22 de setembro com performance para um mágico criada pela norte-americana Angie Keefer , aproveitamos para falar com nossa artista parceira e professora Nathalie Fari sobre a arte de performance no mundo contemporâneo.
b_arco. O que é esse artista visual conhecido como performer?
N.F. O termo performer é mais amplo, pois pode se referir a atores, dançarinos, cantores e outros, enquanto que o artista de performance é aquele que desenvolve um trabalho exclusivo de performance art.
b_arco. Como é ser performer no Brasil? E na Europa?
N.F. A condição de ser um artista de performance não é fácil em qualquer lugar do mundo. Pois, além de você estar lidando com uma arte efêmera e processual, está o tempo todo expondo questões muito pessoais.
O trabalho de performance exige um comprometimento enorme e uma disponibilidade de estar correndo riscos o tempo todo. Não só os riscos que a própria performance exige física e mentalmente, mas também os da sobrevivência como artista. Na maioria dos casos, a performance não gera um produto e sim um acontecimento. É muito difícil atribuir a ela um valor no mercado das Artes. Para muitos galeristas e em eventos diversos, ela tornou-se a “cereja do bolo” ou uma forma mais garantida de atrair público, no entanto.
Portanto, cabe a cada artista encontrar soluções de como e principalmente de onde inserir o seu trabalho, e de como gerar uma continuidade. No meu caso, optei por ampliar o campo de atuação, escolhendo Berlim como o ponto estratégico para estar no momento. Como Berlim encontra-se num continente que tem uma história da arte mais sólida e longa do que a do Brasil, lá eu não preciso explicar para as pessoas o que é performance. Naturalmente, elas vão perguntar que tipo de performance eu faço, mas elas logo me reconhecem como artista. Quando comecei, no Brasil, eu tinha que fazer o trabalho em dobro: explicar o conceito de performance e, ao mesmo tempo, lutar muito pela minha condição de artista.
Atualmente, o Brasil está mais aberto e esclarecido a respeito desta linguagem, além de terem surgido várias plataformas em diferentes estados. Algo que não existia há 15 anos, quando comecei. Em Berlim, ou na Europa em geral, a performance também tem vivido um novo momento, de maior reconhecimento e estabilidade, principalmente a nível institucional. Os museus estão colecionando trabalhos de performance e muitas galerias têm trabalhado com artistas que tem somente a performance como meio principal.
b_arco. Qual a importância da arte de performance para a cultura e para o indivíduo contemporâneo?
N.F. Assim como as outras formas de arte, a performance tem uma importância na cultura contemporânea, principalmente pelo fato de lidar com questões atuais como, por exemplo: fugacidade, mobilidade, transitoriedade e interdisciplinaridade. E por ela ser uma linguagem híbrida e apta a integrar diferentes expressões artísticas, possibilita diversas leituras e interpretações.
A performance tem o potencial de sensibilizar o espectador/indivíduo, pelo fato de se aproximar muito dele e por trabalhar no limiar entre vida e arte, assim como entre privado e público. Isso não significa que toda performance tenha esse potencial de transformação, pois assim como em outras artes, existem performances boas e ruins. Mas não nos cabe aqui julgar a qualidade de um trabalho e sim reconhecer que a performance tem o seu valor, e uma força de mobilização e compreensão acerca de nossa sociedade.
b_arco. Se a performance fala da sociedade e de temas que são comuns a todos nós, por que ainda causa estranhamento em tantas pessoas?
N.F. Para muitas pessoas a performance causa um estranhamento pelo fato de não saberem muito bem como lidar com o que estão vendo. E como muitas performances abordam temas pessoais, assim como expõem o corpo em situações extremas, nem sempre esses trabalhos são fáceis de “digerir”. A performance em si, em muitos aspectos, não e fácil de ler, pois geralmente ela não tem uma dramaturgia clássica, uma história para contar, ou uma coreografia para mostrar. Em sua essência, a performance propõe uma experiência, e são poucas as pessoas abertas a viverem essa experiência. Portanto, ela não atrai o grande público e sim um público específico. Talvez isso também seja o desafio de todo artista que trabalha com performance: como formar um público e como tornar a performance uma arte mais acessível?
Sobre Nathalie Fari
Nathalie Fari (1975, São Paulo) é uma das poucas artistas de performance que trabalha principalmente o site-specific. Ela se refere às suas performances, de estilo único que remetem a instalações, como “obras vivas”. Suas intervenções acontecem em diferentes espaços, como por exemplo: no cubo branco (ou caixa preta), em vitrines, nichos, e apartamentos, assim como no espaço público.
Suas ações minimalistas e, na maioria, mudas, procuram reagir à crescente abundância de estímulos e de informações da sociedade pós-moderna, assim como abrir espaço para novas ideias. “Um dos aspectos essenciais do meu trabalho é a ocupação e a criação de espaços dentro de outros espaços ou lugares” diz. A artista explora minuciosamente cada novo terreno com o corpo e com os sentidos, formando uma espécie de cartografia do lugar.
Licenciada em Artes Plásticas e Educação Artística pela FAAP (1998), Nathalie Fari completou o seu mestrado em Space Strategies na Universidade de Arte e Design Berlin Weißensee (2009), especializando-se em arte no espaço público. Além disso, fez escola de teatro no TUCA da PUC (1995), e também no concorrido CPT (Centro de Pesquisa Teatral) de Antunes Filho (1996).
Desde 2010, Nathalie Fari apresenta projetos e desenvolve oficinas de performance junto ao b_arco. Saiba mais: http://barco.art.br/projeto-desasosiego/